terça-feira, 25 de novembro de 2008

POLÍTICA, IDENTIDADE E ESPAÇO: TERRITÓRIOS E FRONTEIRAS : REFLETINDO UMA POLÍTICA PLAUSÍVEL


OBS. Lembro que este texto faz parte de um conjunto de TRES.

O primeiro foi "REFLETINDO ECONOMIAS PLAUSÍVEIS", que já está no BLOG.

Este aqui, como se vê, diz respeito à POLÍTICA.

Aguardem o terceiro, dedicado especificamente a ÉTICA.


Resumo dos SUB-TEMAS desenvolvidos no texto abaixo:

- ESPAÇO(S), TERRITÓRIOS, FRONTEIRAS:

“LENDO-OS” COMO DESERTOS E OÁSIS, E COMO VERTICALIDADES E HORIZONTALIDADES.

- IDENTIFICANDO POLÍTICA NA VIDA PÚBLICA e IDENTIFICANDO POLÍTICA NA VIDA ÍNTIMA:

É REALISTA SEPARÁ-LAS?

- IDENTIDADE, POLÍTICAS E MASCULINIDADES:

CRISTALIZAÇÕES, PLURALIDADES, E ALTERNÂNCIAS POLÍTICAS; O QUE É (OU PODERIA SER) AUTORIDADE?


Brigo (dentro de mim!) contra os perigosos preconceitos apontados um pouco mais abaixo por Hannah Arendt, referentes à POLÍTICA, e mantenho a crença numa Política plausível, a partir da experiência de tessitura (e/ou navegação) por (no mínimo!) essas três instâncias: pensar-agir-sentir, RESPONSAVELMENTE, é claro.

Com essas três satisfeitas, a compreensão da necessidade política do acolhimento da pluralidade humana (exigido por ela para que a Política cumpra seu papel, se possível merecendo maiúscula) se tornaria auto-evidente; ou inevitável?

Busco apoio para o meu próprio texto em fragmentos de textos de autores “plausabilistas”, como tento também sê-lo, e – creio - respeitabilíssimos: Friedrich Schiller, Hannah Arendt, Robert Kurz, Rosiska Darcy, Anthony Giddens, Rose Marie Muraro, Samuel Beckett, Alain Tourraine, Jorge Luis Borges, Manoel Castells, etc.


Talvez assim eu dificulte a tarefa de quem pretenda se precipitar a me chamar de exageradamente reflexiva, patética ou romanticamente utópica, etc. A não ser que estes pretendam o atrevimento de dizê-lo também dos demais autores...rsrsrsrs...


Assim, deixo já a definição de abertura para a especialista Hannah Arendt, já que ela, além de brilhante, deixa generosamente as portas abertas para que eu desenvolva depois exatamente as questões que pretendo:

“... A política se baseia no fato da pluralidade humana. Deus criou o homem, mas os homens são um produto humano, terreno, um produto da natureza humana. ”... ”Política diz respeito à coexistência e associação de homens diferentes.” ... ”o significado da política é a liberdade.” ...”A definição de política como meio para se alcançar a liberdade como um fim que lhe é exterior só se aplica em um grau muito limitado na era moderna, apesar de reiteradamente postulada.” ...”E não podemos mudar o mundo mudando as pessoas que vivem nele – à parte a total impossibilidade prática de tal empresa – tanto quanto não podemos mudar uma organização ou um clube tentando, de alguma forma, influenciar seus membros. Se queremos mudar uma instituição, uma organização, uma entidade pública qualquer existente no mundo, tudo que podemos fazer é rever sua constituição, suas leis, seus estatutos e esperar que o resto cuide de si mesmo.” ...”O homem, tal como o conhecem a filosofia e a teologia, só existe – ou só se realiza – na política na forma de direitos iguais que os absolutamente diferentes garantem uns aos outros. Essa garantia voluntária e essa outorga do direito à igualdade jurídica reconhecem a pluralidade dos homens, que podem então dar graças a si mesmos por sua pluralidade e ao criador do homem por sua existência.” ...”não sabemos, pelo menos não ainda, conduzir-nos politicamente. O perigo é a política vir a desaparecer do mundo. Os preconceitos invadem nosso pensamento; jogam o bebê fora junto com a água do banho, confundem a política com aquilo que levaria ao seu próprio fim (ao seu próprio término) e apresentam essa catástrofe como algo que é inerente à natureza das coisas e, portanto, inevitável.” ...”freqüentemente nos esquecemos do aspecto espacial das leis. Toda lei cria, antes de tudo, um espaço no qual é válida, espaço que é o mundo no qual podemos nos mover em liberdade. O que está fora deste espaço é sem lei e, mais precisamente, sem mundo; no que respeita a comunidade humana, fora desse espaço tudo é deserto.” ...”Os oásis (implícitos em qualquer deserto!) são as esferas da vida que existem independentemente, ao menos em larga medida, das condições políticas. O que deu errado na política, a nossa existência plural, não o que podemos fazer e criar em nossa existência no singular: no isolamento do artista, na solidão do filósofo, na relação intrinsecamente sem-mundo entre seres humanos tal como existe no amor e às vezes na amizade – ou quando o interstício, o mundo, se incendeia, como no amor. Sem a incolumidade desses oásis não conseguiríamos respirar, coisa que os cientistas políticos deveriam saber.” (Arendt, H.; 2005, pág. 144, 145, 146, 148, 159, 161, 202, 253, 267, 268; parênteses sem itálico, e negrito meus).


Para deflagrar um processo de definição está bom. Mas...

Como a Política “ACONTECE”?


Gera - se (ou não) Política a partir de exercer ou deixar de exercer o Pensamento. Como exemplos de textos que exibem o Pensamento como um Espaço ou um Território, gerador das Fronteiras da Política, vejamos:


a) PENSAR gerando Política:

“Para Sócrates, o homem não é ainda um ‘animal racional’, um ser dotado da capacidade da razão, mas um ser pensante cujo pensamento se manifesta na forma do discurso. Até certo ponto essa preocupação com o discurso já existia para a filosofia pré socrática, e a identidade do discurso e pensamento, que juntos são logos, é talvez, uma das características mais notáveis da cultura grega. O que Sócrates acrescentou a essa identidade foi o diálogo do eu-comigo-mesmo como condição primária do pensamento. A relevância política de Sócrates é ela afirmar que a solidão, antes e depois de Sócrates vista como prerrogativa e habitus profissional exclusivos do filósofo, e que a polis naturalmente suspeitava ser antipolítica, é, ao contrário, a condição necessária para o bom funcionamento da polis, uma garantia melhor do que as regras de comportamento impostas pelas leis e pelo medo da punição.” ...”Não pode conservar a consciência intacta o homem que não possa atualizar o diálogo consigo mesmo, isto é, que careça da solidão requerida por todas as formas de pensamento.” (Arendt, H.; 2005, pag. 66, 67 e 68).

b) DEIXAR DE PENSAR gerando, talvez, Política de qualidade reflexiva e pluralidade duvidosas:

"Eu diria até que se deve proceder a uma crítica do próprio conceito de política. Na discussão Marxista existe o conceito pejorativo do economicismo. Eu penso que a orientação, segundo a dimensão política (segundo o político), foi teoricamente e em princípio um movimento de desvio do Marxismo, no qual o Marxismo não se colocou certos problemas (ainda não suficientemente)". (Kurz, R. 1998, p.81; parênteses sem itálico meus).


Gera – se também Política a partir do corpo, o que inclusive torna a concretude da ação possível; vejamos o exemplo em um fragmento de texto que, aliás, diz respeito diretamente a questões identificadas com este BLOG:

..."Assim, aqui postulamos tanto a universalidade do desejo quanto a da produção e que a relação entre eles é feita de instituições, leis, normas de comportamento, mecanismos econômicos, etc., dentro das instâncias econômicas, política e jurídico - ideológica.

Postulamos ainda, que é dentro destas três instâncias que se realizam o processo de produção/exploração, apropriação/dominação e distribuição/consumo dos bens materiais produzidos, bem como mediante a atuação do "dispositivo da sexualidade", as articulações/representações do desejo com a produção" ..."O corpo é a base da percepção e organização da vida humana, tanto no seu sentido biológico como social. Assim, falar, andar, olhar, são modos socialmente determinados de sentir pensar e toda uma visão do mundo. Essa visão passa pela divisão social do trabalho: há gestos e posturas, modos de ser considerados masculinos e femininos e, através deles, meninos e meninas se identificam com seu sexo, tal como ele é socialmente definido. Daí a cisão cultural da visão do mundo do homem e da mulher. Assim, qualquer gesto envolve o reconhecimento de uma ordem política dada, que distingue a posição hierárquica dos homens, das mulheres, das idades, etc...” (Muraro, R. M.; 1980, p.23).


Gera – se, ainda, Política a partir das Emoções, transitando crises com dor (será possível jamais perder o otimismo?), buscando navegar entre o conflito e a comunicação; mais um exemplo textual, não para que concordemos com ele, mas para que pensemos no assunto:

..."O grosso das mulheres está absurdamente sobrecarregado com a tarefa de responder, ao mesmo tempo, pelo dinheiro, pelas atividades domésticas e pelo 'amor'. Na pós-modernidade o patriarcado não some, antes 'se embrutece' e se estilhaça em formas múltiplas da barbárie, como escreve a feminista alemã Roswitha Scholz. ‘Este é o mundo que transforma crianças em assassinos e psicopatas’”... (Kurz, R. Texto “O eterno sexo frágil” , Coleção Caderno Mais! / Folha de São Paulo de 2000).


Gera-se Política também quando todos esses fenômenos atuam juntos, e Isso já é pensado e documentado há muito tempo:

...“Hoje, porém, a privação impera e curva em seu jugo tirânico a humanidade decaída. A ‘utilidade’ é o grande ídolo do tempo; quer ser servida por todas as forças e cultuada por todos os talentos. Nesta balança grosseira, o mérito espiritual da arte nada pesa, e ela, roubada de todo estímulo, desaparece do ruidoso mercado do século” ... ”Espero convercer-vos de que esta matéria é menos estranha à necessidade que ao gosto de nosso tempo, e mostrarei que para resolver na experiência o problema político é necessário caminhar através do estético, pois é pela beleza que se vai à liberdade. Essa prova, contudo, não poderá ser feita sem que eu traga à vossa memória os princípios mediante os quais a razão se guia em geral numa legislação política”... (Friedrich Schiller, em 1791!; “A Educação Estética do Homem”, 2002, pág.22).


OK! Mas o que tudo isso tem a haver conosco, já que “não somos políticos”... profissionais?


Um resumo dos temas políticos pertinentes, experimentados por todos os homens e todas as mulheres contemporâneos (pós-modernos?), e que andam exigindo ser bem mais debatidos, poderia ser:


· O colapso de experiências socialistas de Estado como sintoma do início do fim do sistema político-econômico mundial moderno; (pretender acabar com o capitalismo estatizando as instituições, etc.);

· As críticas plausíveis que a esquerda (através de seus teóricos e seus políticos) já poderia ter começado a se colocar com maiores veemência e transparência;

· O duelo esquizóide entre sucesso e colapso na experiência capitalista, a partir do desenvolvimento que ela historicamente tomou, e que mais uma severa crise vem por a nu, inclusive quanto à ausência de legitimadas autoridades que se assumam como politicamente responsáveis;

· A urgência que cerca o sujeito político pós-moderno de resgatar (filosoficamente inclusive, como já reivindicava Sócrates, e como nos lembra Hannah Arendt) o questionamento do sistema de produção de mercadorias e da lógica da forma mercadoria (da racionalidade da forma da mercadoria), que exibe este igualmente falido capitalismo; sonharia Marx que o fetichismo e a reificação se tornariam temas mais pertinentes e urgentes que o da luta de classes?...

· A dificuldade de criar saídas a partir da perda de impecabilidade no "desenho" de fronteiras ideológicas-político-territoriais (real e absurdamente recente) na pós-globalização;

· O atualmente confuso papel do Estado Nacional, onde as classes políticas estão fixadas em fronteiras geográficas, enquanto o capital opera num espaço econômico que "desobedece" o Estado Nacional, exigindo dele (e de seus habitantes?), freqüentemente, respostas em tempos e prazos humanamente inexeqüíveis;

· A manutenção do questionamento (que parece sabotado pelo desgaste de uma ainda recente hiper-exposição) sobre o que já foi chamado de Espaço Político da Vida Íntima, cujos componentes predominantemente excludentes interferem no Espaço Político da Vida Pública: os debates sobre hierarquias e poderes domésticos e demais questões de gênero (como o nosso tema preferido, as masculinidades); os debates sobre os conflitos de relações por hierarquias e poderes (e/ou direitos e deveres) entre diferentes grupos etários (a criança, o jovem, o adulto, o idoso); etc.

· O questionamento sobre como superar a fragmentação de articulações entre os que se dizem opositores desta racionalidade excludente que vivemos e da qual reclamamos, para que eles reaprendam a contestação, para que se tornem renovados atores sociais, conseqüentemente se organizando de maneira adequada, e - com a justa indignação – AJAM, rumo à construção de novas experiências, mais flexíveis quanto à alternância de poderes, e que mereçam – de fato - ser chamadas de “humanas”.


A energia, o fluxo, do poder sobre processos decisórios costumam ser exercidos ao mesmo tempo vertical e horizontalmente (no próximo texto prometido, especificamente sobre Ética, levantaremos uma terceira possibilidade).


O Estado parece não deter mais o domínio decisório dessas faces vertical e horizontal que supostamente lhe cabiam. É obrigado a dividí-lo com o Mercado, que per-verte freqüentemente o Capital por cada reentrância que vai encontrando, concentrando-o em poucos e limitados “lagos” (“países ricos”) por períodos variáveis, deixando a maior parte do território humano “seco” todo o tempo (“países pobres”, ou ditos “em desenvolvimento”, ou ainda “emergentes”; o que importa a nomenclatura?).


“Lagos”, “securas desérticas”, e conseqüentes exclusões, que vemos reproduzidos de várias formas em vários recortes do planeta: dentro de cada país, dentro de cada setor regionalizado de cada país, dentro de cada cidade, de cada bairro, de cada instituição, e muitas vezes reproduzidas dentro de muitas (micro) instituições, inclusive ainda nas familiares.

“Lagos e Desertos” que costumam se cristalizar em suas excludentes distinções, excluindo também a possibilidade de alternância de poderes ou qualificações circunstanciais...


Em tempo, lembro que Hannah Arendt acrescenta ao “homem” criado por Deus (diferente dos homens, criação de nossas humanidades) o conceito de “família”, também como nascido em “fôrma” divina, como modelo a ser compulsoriamente reproduzido em todas as instâncias, inclusive na Política. “Casas Grandes, Famílias Reais, Oligarquias” e conceitos afins são apenas reproduções especialmente perversas que continuam a emergir da política meramente partidária; reproduções visivelmente patriarcalistas antes mesmo de serem patrimonialistas, e não são “privilégio” brasileiro. Se os nomes familiares “Sarney”, “Magalhães”, “Maia” e “Collor” (entre TANTOS outros) são fantasmas que continuam a assombrar nossos “castelos”, lembremos outros, de outras terras, como “Bush”, “Clinton”, “Perón”, “Kirschner”, etc.

Hannah, em “A Promessa da Política”, lembra que a aparente harmonia reinante na polis, já dependia de acordos que começavam na intimidade do lar:

...(o regime da escravidão e tudo o que era imposto às esposas e filhos) visava a libertar completamente seus senhores do trabalho para que pudessem desfrutar a liberdade da arena política. Essa libertação, obtida por meio da força e da coação, baseava-se na dominação absoluta que cada chefe de família exercia sobre sua casa. Mas essa dominação não era ela própria política (naquela circunstância), embora fosse um pré-requisito indispensável de tudo que era político”. (Arendt, H.; pág. 171 e 172; 2005. Parênteses sem itálico meus).


Desigualdades e exclusões no exercício do poder político vão do topo à base dessa verticalidade (“países ricos” – “países na miséria”), e mesmo de uma ponta a outra das horizontalidades (partidos políticos rivais, etnias rivais, religiões rivais, castas rivais, etc.).

Exercício de poder político com definições cada vez menos claras, ou justificáveis apenas por meia dúzia de resistentes Ideologias que assumem perniciosos e perigosos ares fundamentalistas. Tiranias? Estão onde a Política desapareceu. Hannah denuncia-o nos fragmentos de sua definição, acima.

Mas não são as “verticalidades” nem as “horizontalidades” em si que são por princípio “más”, “vis”, fundamentalistas – ou tanáticas (da maneira em que predominantemente têm aparecido), e como prefiro chamar, inclusive pelo caráter regressivo, infantilizado que demonstram quando assim se manifestam.


Assim como se costuma afirmar que “quanto maior a liberdade, menor a igualdade” e que “quanto maior a igualdade, menor a liberdade”, na mesma proporção talvez possamos afirmar que “quanto maior a desigualdade, menor a pluralidade”, e que “quanto maior a pluralidade, menor a desigualdade”; claro.

É? Claro para quem? QUEM está realmente preocupado com isso? Olho pela janela e não vejo sequer pequenos grupos preocupados, angustiados, reunindo-se para refletir sobre isso (pensar), suficiente e francamente indignados com isso (sentir), buscando agir responsavelmente contra isso, transgredindo o desigual e ainda tão pouco plural marasmo ambiente, aos quais, identificada, aderir.

Resta-me aderir às teclas e a dois ou três (“desocupados”?) leitores...

Aparentemente “desocupados”, pois quem pretenda PENSAR sobre o que quer que seja precisaria LER, compartilhar idéias.

Não que devessem estar lendo o que EU escrevo, mas não vejo muita gente lendo os autores consagrados, igualmente... (Daí, também, a necessidade de compartilhar com quem se aventura por aqui estes fragmentos dos autores que aqui aparecem; quem sabe dê vontade de lê-los a quem aqui passar?

Aviso, e garanto, que NÃO DÁ AZIA).


Uma das palavras favoritas nos meios intelectuais é “transgressão”; no entanto a concretude da contestação e de ação é cada vez mais rara, pequeníssima e lentíssima; a justa indignação parece uma gasolina que por algum motivo perdeu sua capacidade de combustão.


O que voltaria a gerar e a legitimar verticalidades e horizontalidades eróticas (energéticas, criativas, responsáveis) no exercício de poder político, na Política, da vida para a Vida?

Sim, porque Política não é função exclusiva dos profissionais da área; Política é coisa dos homens para os homens, para o homem e seus descendentes.

Apoiada por muitos autores, eu responderia que uma renovação da sustentação ideológica, num primeiro movimento não ainda “partidária”, que guiasse os processos verticais e horizontais para uma igualmente renovada navegação no processo de humanização (desenvolver sentimentos, pensamentos, comportamentos e responsabilidades que mereçam o título de humanistas), o que exige recomeçar por muito PENSAMENTO, por muita reflexão (repito-o, de “caso pensado”...).


É um dos pontos nevrálgicos feridos na crise instalada, inclusive entre os (supostos) “contestadores” e demais contestadores em potencial: aqueles que agora ao menos imaginam, e talvez ensaiem ações.

Mas quando a “fome” é grande (de contestação), a precipitação eventualmente “assalta", gerando nada além de assaltantes amadores, que tropeçam.

E PENSAR é coisa que pede noção de interioridade e tempo; não combina com precipitação, assim como não funciona com paralisação.


Assim, na Política, o debate não precisaria se manter como uma mera discussão do último FLA-FLU, ou mesmo uma disputa “infantilóde” de meninos brigões de três anos, na pracinha do bairro, achando que o mais forte é aquele que tem mais carrinhos ou biscoitos, como se – aliás – fosse “importantíssimo” ser “o mais forte”; de meninos que ainda estão brincando de simbolicamente matar papai para possuir mamãe, perpetuando o prazer onanista da brincadeira, sem elaborá-la; procrastinando a elaboração, fugindo de experiências de tentativas de amadurecimento ou expansão ...


Logo, nem a precipitação de “partir para a pancadaria” nem a paralisação do “adiamento onanista” se prestam a “botar a coisa para andar”; que coisa?

O Pensamento, o Sentimento, a Ação, e a Responsabilidade!


Carentes dessa guia reflexiva, quaisquer verticalidades e horizontalidades no fluxo do exercício de poder decisório se tornam ou se mantêm tanáticas, enquanto as possibilidades de contestação se mantêm também infantilizadas, estéreis, suicidas; logo, igualmente tanáticas.


Pensemos (e leiamos), pois! As crianças (de verdade) continuam a nascer e o merecem: somos responsáveis por TODAS ELAS.


Há uma crise recorrente, apenas com sintomas próprios a cada eclosão.

Os custos referentes às atividades do Estado são tidos pelos tecnocratas do dinheiro como compulsório fruto de “mau gerenciamento estatal”, quando na realidade representam muitas vezes o nível civilizatório da modernidade (alguém duvida que investimentos em modernizadas Educação e Saúde Pública podem ser bons, bem executados, e legítimos investimentos do Estado?), e quando nos deparamos com corrupção, poderíamos e deveríamos vê-la como conseqüência ou sintoma da crise, e não necessariamente como sua compulsória causa.

Tecnocratas do Mercado, aliás, que costumam preferir tirar as massas humanas “não - consumidoras” da ordem civilizatória e lançá-las à barbárie: isso, sim, um freqüente e indiscutível péssimo gerenciamento.

Atirar a primeira pedra “é moleza” (outra coisa que já é dita há MUITO tempo…)


O que esperar do Estado (atrelado ao Mercado por natureza) e/ou da Política, após a eclosão de crise que vivemos?

- ESPERAR?...

- NÃO!, gritam muitos autores; o alemão Robert Kurz já citado aqui é apenas um deles.

Muitos outros autores (e modestamente eu) gritamos em uníssono, com ele.

Há um alerta, emergindo daqueles que já “gritam”, quanto à necessidade de reflexão e reavaliações de todos os envolvidos na crise (no colapso?) da modernidade/pós-modernidade, para que - em nome da possibilidade de sobrevivência com nível civilizatório mínimo - seja possível substituir conflitos tanáticos e filicidas já obsoletos por novos conflitos dialogáveis.

Conflitar-se é humano, e não necessariamente ruim.


Este alerta clama por uma nova proposta de comunicação, novas propostas de negociações, novas propostas de acordos: entre Mercado e Estado, Economia e Política, Vida Íntima e Vida Pública, profissionais da área e homens em geral.


Este alerta pede que esta comunicação volte a se apoiar em ideologias que retomem a nobreza do lugar do prévio exercício da intralocução (do diálogo do eu-consigo-mesmo), que - em conseqüência (espera-se) – redespertará uma melhor noção de alteridade, que por sua vez apoiará uma menor tendência à exclusão e, ao contrário, um maior acolhimento da pluralidade humana nos passos seguintes de interlocução para essa plausível reconstrução ideológica.

Isso resultaria (inevitavelmente?) em ação.

Ação apoiada por um emocionado pensar.


Não esqueçamos que, já de muito tempo para cá, há este “subtexto supostamente velado” nos rondando, que parece nos obrigar a lembrar também, a todo o momento de nossas vidas, este ponto (eternamente?) dolorido: não só também o universo íntimo é político, como a Política não se tornará algo que de fato poderá ser chamado de íntegro enquanto não incorporá-lo.


Como vimos, faz parte de sua própria história (Polis- Política), e agora é questão de vida ou morte para ela.

Vejamos mais um texto que esclarece isso ainda melhor:

"Isto apontaria para uma revalorização de certos movimentos considerados 'não políticos' ou 'pré - políticos', que a esquerda tradicional sempre subestimou, como os movimentos de mulheres, de juventude, a contracultura, a ecologia, entre tantos outros?...” ”..."Eu penso que a questão deve ser formulada precisamente nestes termos. E, naturalmente, nós já conhecemos tais movimentos na Alemanha, na Europa, mas, certamente, eles já foram experimentados no Brasil (ou em outros países do terceiro mundo). Eu penso que a gente não deve se deixar assustar pelo fato de que estes movimentos no passado sofreram apenas reveses. Foi talvez a primeira tentativa do passado, assim como o antigo movimento operário teve de dar muitas largadas para poder cumprir o seu papel histórico.

Penso que o ponto central para que tais movimentos futuramente possam desenvolver uma crítica mais aguda, uma crítica mais precisa e pertinente das relações existentes, seria ligar o conteúdo e os questionamentos concretos destes movimentos com uma crítica coerente do sistema de produção de mercadorias e da lógica da forma mercadoria, quer dizer, da racionalidade da forma da mercadoria. E isto, até o presente, foi antes uma questão extremamente esotérica, uma questão aparentemente filosófica, mas, talvez agora, tenha chegado o momento no qual as potências e as próprias forças produtivas, o próprio Estado do sistema mundial permita que esta crítica, estes questionamentos, possam pela primeira vez ser feitos em termos concretos e práticos"... (Kurz, R.; 1998, p. 82 e 83).


o lugar erótico das verticalidades e horizontalidades do fluxo do exercício de poder está proposto: a democratização a partir da democratização do Espaço da Intimidade (a nobreza da prévia intralocução, e a interlocução sendo assumidamente Política no debate das questões de gênero, de conjugalidades e família, por exemplo) como “duplo”, ou solidária “irmã gêmea”, da conseqüente redemocratização do Espaço Público.


Volto a lembrar que faço questão de exibir textos de autores consagrados como apoio, pois a mim seria muito fácil (simples mesmo!) chamar no mínimo de utópica; quem sabe de “biruta”...

Já a consagrada Rosiska Darcy de Oliveira, em 30 de março de 2008, teve a oportunidade de “socializar” através de um veículo razoavelmente popular (uma coluna do Jornal “O Globo”) as idéias que tem desenvolvido em seus livros, aulas e palestras; aqui, um importante fragmento desta inesquecível coluna:

...”As feministas tinham razão quando se queixavam de que as mulheres assumiam muito mais responsabilidades do que os homens na vida privada, mesmo quando respondiam por metade do orçamento familiar. Mas enganaram-se quando buscaram a solução numa negociação doméstica como se fora um problema de organização do cotidiano que depende apenas de mudanças de mentalidade. O mundo do trabalho, hoje, tal como ele se organiza, ou desorganiza, põe a nu a natureza do problema que aflige minha jovem amiga, um problema de sociedade, público, não privado, envolvendo muito mais atores de que um simples casal às voltas com as exíguas vinte e quatro horas em que fazem caber o que antes seriam muitas vidas. A empresa e a família estão se tornando grandes rivais.

Oculta na intimidade dos lares, a difícil conciliação entre trabalho e vida privada ainda não foi chamada pelo nome de problema social. Um problema só encontra solução quando é reconhecido como tal. A ocultação do privado, que os empregadores insistem em ignorar, é a verdadeira responsável pelo mal-estar cotidiano de homens e mulheres, pois, na vida real, as vidas multifacetadas, as dimensões do público e do privado se misturam como as imagens de um caleidoscópio. Responsável também por problemas correlatos, mas não menos relevantes, como a juventude que cresce entregue a si mesma, ou idosos que carecem de uma atenção que requer tempo.

Rever a lógica das instituições, suas temporalidades – e a inovação é hoje o motor da vida empresarial -, imaginar soluções para o problema do uso do tempo de homens e mulheres, abrindo espaço para a vida afetiva, impediria que os laços que unem as duas esferas da vida se transformassem em um nó impossível de desatar, amarrando as tentativas de compatibilizar igualdade e bem-estar. ”

...”A uma nova geração de mulheres, desta vez com o apoio dos homens, cabe a defesa de mais esse aspecto da liberdade, algo que as feministas de então teriam talvez chamado ‘nosso tempo nos pertence’”.


Acrescento que indivíduos solteiros também são donos de seu tempo, e que o tempo que lhes sobra para cuidados com sua própria interioridade (O BEM SUPREMO!) é igualmente exíguo e precioso; e, claro, é (ou deveria ser) também DIREITO DELES.

Acrescento ainda que os conceitos de família e conjugalidades já são diferentes, amplos, elásticos hoje em dia (felizmente!); e o TEMPO de cada um é (ou deveria ser) - sempre - de cada um!...


Sem qualidade de interioridade é impossível construir qualidade de alteridade!

É: ISSO É POLÍTICA, também.


Essa é a sustentação ideológica plausível, que emerge da evolução e desenvolvimento dos movimentos “alternativos” citados acima, possibilitando nova comunicação, que apoiará a ação: ação (atuação?... ato-ação?...) de (novos?) atores sociais.

(Aliás, até quando a gente vai chamar certas iniciativas de “alternativas”, compreendendo-o, no inconsciente já embebido em cristalizações do senso comum, como se fosse bobagens de jovens descerebrados?)

Com isso, tanto a face horizontal como a vertical das hierarquias voltaria a ter Sentido, lugar de “cola” e/ou de responsabilidade social.


..."Se hoje a reprodução é triturada entre o Mercado e o Estado, precisamos imaginar algo diferente do que esperar por Godot, isto é, esperar pelo próximo 'milagre econômico' do sistema produtor de mercadorias, que nunca mais acontecerá". (Kurz, R.; 1998, p.115).

Assinalemos que o íntimo como político se expressa mais uma vez aqui, na medida em que a “convocação metafórica” se dirige, segundo Robert Kurz antes aos “Vladimires e Estragons” (indivíduos singulares), e não a Partidos, à “massa”, e/ou líderes ideológicos, tecnocráticos ou governamentais.

Em tempo: Vladimir e Estragon são os protagonistas do magnífico texto teatral “Esperando Godot” de Samuel Beckett, que - com toda a sua complexidade - fez sucesso até na Penitenciária de San Quentin, arrancando lágrimas de mil e quatrocentos presidiários, para a (preconceituosa?) surpresa da Companhia do Actor’s Workshop de San Francisco, em 19 de novembro de 1957.

Neste texto, dois (aparentemente) vagabundos discutem o sentido de existir, enquanto - ao invés de tomar providências -... “esperam Godot”.

Há também as personagens Pozzo e Lucky, que poderiam insinuar (entre vários fenômenos humanos) os arquétipos do Senhor e do Escravo, respectivamente.

Ainda em "esperando Godot", a personagem Lucky espelha e ilumina a face fantoche de Vladimir e Estragon; o quanto lhes falta a autonomia.

Cristalizado fantoche perante cristalizado Godot. Perante “Godot-impossibilidade de felicidade”, perante “Godot-Deus Pai”, perante “Godot-Patriarca”, perante “Godot-Superego paralizante”, perante “Godot-Patrimonialista”, perante “Godot-Tecnocrata”, ou “Godot-Estado Burro”, ou ainda “Godot-Mercado Perverso”.

A personagem Pozzo pode ser também a “face (manipuladora?) de Godot encarnada”.


Acrescentaria uma pergunta: esta “convocação metafórica” se refere inclusive aos riscos de uma “eternalização da fragilidade” deste ou daquele sexo? Desta ou daquela etnia? Desta ou daquela cultura? Desta ou daquela espécie?

Se o Kurz de "Os últimos combates" (1998) é o mesmo de "O eterno sexo frágil" (2000), seus textos cujos fragmentos vimos até aqui, - e a sadia indignação exibida em ambos o confirma - creio que a resposta é óbvia, e desafiadora. Desafiadora tanto a "Godot", quanto aos cristalizados conformistas.


No "mundo já além da esquerda e da direita” de outro autor, Anthony Giddens, dificilmente se esperará por Godot. Dificilmente a própria "Tradição" deixará de tentar “respirar novos ares”, mesmo nos núcleos neoliberais, enquanto estes conseguirem sobreviver, nos causando antipatias, alergias, ou não. Um neoliberal que não “deixa o status quo respirar novidades” porque é “bonzinho”; e sim porque sabe que “novidades” podem gerar novos mercados! Mas DEIXA! Isso é verdade; e depois que deixou, a “novidade” gera seus “ovinhos-de-novas-novidades”, que não têm volta, felizmente, e provocam inevitáveis reflexões…

... "No entanto, é preciso distinguir entre conservadorismo e direita. 'A direita' significa muitas coisas diferentes em diferentes contextos e países. Mas uma das principais formas em que o termo é usado atualmente é na referência ao neoliberalismo - e especificamente à conservação da tradição enquanto ´sabedoria herdada do passado’. O neoliberalismo não é conservador nesse sentido (bastante elementar). Ao contrário, ele dá início a processos radicais de mudança, estimulado pela incessante expansão de mercados. Como já foi dito, a direita tornou-se radical, enquanto a esquerda busca principalmente preservar - tentando proteger, por exemplo, o que sobrou do WELFARE STATE"... (Giddens, A; 1996, p. 17).


Assim, enquanto Kurz (em 1998 e em 2000) propõe criticamente que conscientizemos que a “coisificação” é o problema, e que a luta de classes não foi a saída, Anthony Giddens (1996) faz, em sua obra, uma crítica bastante semelhante, propondo também, em outros momentos, um aprofundamento da discussão de temas como: violência como mais um sinônimo de questão política, classificando - a, inclusive, como conseqüente da “coisificação” dos seres humanos, do dueto fetichismo/reificação, desde a Intimidade, até a vida pública do cidadão, e sugere - também – as mesmas palavras-chave: autonomia e ação, que sempre prefiro ver somadas à weberiana responsabilidade.

...”A solidariedade ampliada em uma sociedade destradicionalizadora depende do que poderia ser chamado ‘confiança ativa’, acompanhada de uma renovação de responsabilidade pessoal e social em relação aos outros. A confiança ativa é a confiança que tem que ser conquistada, em vez de vir da efetivação de posições sociais ou de papéis de gênero. A confiança ativa pressupõe autonomia em vez de posicionar - se contra ela...” (Giddens, A., 1996, p.22)...


Texto que “dialoga” com este outro, angustiado e ainda sem respostas, de R. Kurz:

"A luta entre o Homo economicus e o Homo politicus renovou-se constantemente; a cada surto de modernização, a cada crise, os ' individualistas ' e os ' coletivistas', os livre empresários e os planejadores da economia, os gerentes de empresas e os burocratas estatais, os defensores do liberalismo econômico e os intervencionistas, os adeptos do livre comércio e o protecionistas, enfrentavam-se em combate”... "Nós já não temos mais mundos bonitinhos separados, mas uma espécie de colcha de retalhos, e nesta colcha de retalhos se evidencia o caráter unitário do sistema global em meio à sua crise"... "Se o nível civilizatório não é mais financiável, então isso significa apenas que a contradição sistêmica interna chegou à sua maturidade histórica"... "Assim, o próprio processo capitalista priva-se, em última instância, das condições do seu funcionamento, na medida em que ele minimiza a sua própria substância (o trabalho abstrato) “... "E quanto ao 'depois’: como haverá um 'depois', se com uma quantidade cada vez menor de trabalho forem produzidos um poder aquisitivo cada vez menor e uma quantidade cada vez maior de produtos? A prosperidade global da economia de mercado somente existirá no futuro se for possível realizar a façanha de um capital acumulado sem trabalho”... "O problema é, penso, como se pode, a partir do reconhecimento da paralisia na qual se encontra a forma política, como se pode sair dessa paralisia e como a gente (indivíduos singulares e pensantes) pode se emancipar (reconquistar pensamento crítico e autônomo-sentimento autônomo-autonomia de ação), para formular de maneira paradoxal, como pessoa política da forma política tradicional"... (Kurz, R.; 1998, p. 91, 84, 110, 112, 114, 83; parentes não itálicos meus).


Reflexão, indignação, angústia e otimismo podem compartilhar o mesmo endereço.


Há três coisas que uma profissional que navega em busca da humanização (inclusive na Política e na Identidade de Gênero) não tolera mais: catastrofismos, clamar (acompanhada apenas por outras mulheres) que "o pessoal é político", e falta de humor...


Talvez os focos (que lenta mas gradualmente eclodem) de compartilhamento masculino dessas Questões sejam uma das maiores conquistas femininas das últimas décadas: conquista por consenso, de baixo para cima, incrementando redes descentralizadas do pensamento e do saber humanos: a história do clamor das mulheres despertando os homens para possíveis clamores; os particulares e os que compartilham com as mulheres (como o direito ao TEMPO citado por Rosiska).


E a AUTORIDADE, como vai?

Fui, há algum tempo procurada por um grupo de professores da escola em que trabalhei por um pouco mais que seis anos como psicóloga.

Eles, além da jornada no estabelecimento que atendia crianças da elite sócio-econômica carioca, trabalhavam também na rede pública.

Estavam impressionados com o pensamento-comportamento igualmente desrespeitoso de crianças emergentes de universos culturais aparentemente tão diferentes.

Nos dois universos, os meninos (os seres nascidos com sexo masculino) andariam grosseiramente violentos, desdenhando com especial desprezo o contato amoroso ou respeitoso de qualquer espécie; mas as meninas não estavam “vacinadas” quanto o que ocorria.

Apenas era unânime que o caso dos meninos assumia um caráter de maior gravidade. Não deveria ser necessário ressaltar que o primeiro contato amoroso ou respeitoso a ser desdenhado e desprezado nestes casos era o contato consigo mesmo, o reflexivo, com alguma coisa que construísse e merecesse o nome de interioridade; mas, lembrêmo-lo mesmo assim.

Fizemos uma reflexão sobre o assunto, e a conclusão sobre qual era o “alimento comum” daqueles pensamentos/comportamentos foi: o alimento comum é a reificação, a “coisificação”; o fetichismo entrava de “tempero compulsório, ali TORNADO importante”.

Quem “se alfabetiza na vida, lendo” que o mundo não lhe “dá a mínima”, reage não tendo outra coisa que não o frio desrespeito para devolver.

Se a maioria dos adultos se dá “ao desfrute” de fazer de conta que o “filicídio ambiente” não existe, as crianças o enchergam MUITO bem, porque seu inconsciente - de ótimo faro! - lhes mostra o pouco caso desses supostos adultos com as crianças do mundo: trabalho infantil, prostituição infantil, pedofilia, abusos e maus tratos domésticos abundantes, crianças (aos magotes) entregues às ruas, jovens (aos magotes) enviados para morrer por guerras que eles não planejaram, abandono de bebês, pouco caso com a Educação e com a Saúde Públicas onde a criança é a primeira a ser desassistida, pais negligentes ou violentos, professores despreparados, etc.

Quem “se alfabetiza na vida, lendo” que o mundo não lhe “dá a mínima”, porque esse mundo supostamente adulto não “dá a mínima” para o contato amoroso, sendo também algo que o trata desrespeitosamente a todo momento, não tem outra coisa que não o frio desrespeito para devolver; péssimo, mas compreensível.

O primeiro “Mundo” (território e fronteira parte solitários, parte plurais) que qualquer criança (independentemente do berço em que nasça) “lê”, é o íntimo/pessoal; é a sua primeira política, seu (o nosso) primeiro contato com a Política! “LÊ” com a força, com a potência energética e marcante que só o inconsciente humano tem, sem que o consciente (a racionalidade tão valorizada) tome conhecimento...

Neste Mundo infelizmente ainda filicida, a fragilidade real das crianças não as torna cegas, surdas nem “bobinhas”, e MUITO MENOS más.

Nada impedirá que muitas delas venham, um dia, autônoma e criticamente, a optar por uma indignação erótica ativa.

É: sou otimista.


Só personagens e coisas podem, precisam, ficar estáticos, esperando sabe Godot o quê, mesmo depois que seu transitório dono (ou autor) de carne - e - osso morre; estáticos e "impecáveis": tanáticos, como “As Coisas” do poema de Jorge Luis Borges (veja o poema na coluna vermelha à direita aqui mesmo no BLOG).

Atores (sociais) têm corpos, intimidade, sexualidade e diferenças por princípio capazes de construir senso crítico, sua própria crítica: a melhor arma contra a burrice e o marasmo conformista que o senso comum tenta cristalizar.

“Coisas vivas”, eróticas, (a construção da crítica, e da capacidade de diálogo, por exemplo) são plurais, móveis, mas “pecáveis”; para elas a impecabilidade não tem lugar; impecabilidade é coisa para mortos.

Em compensação são capazes de reelaborar negociações, fazer mediações. Isso acontece com maior facilidade quando os indivíduos têm o direito de aprenderem-no desde o início de suas vidas.

É a crítica que nos leva além da “Tradição”, na aventura (vertigem?) do correr riscos: botando, sempre que necessário, até mesmo uma “Ideologia” duramente reconstruída e/ou reconquistada, à prova do risco da renovação da crítica.

Viagem da Tradição à Tradução.

Um sujeito reflexivo, crítico, autônomo, inevitavelmente chega ao debate do “Pessoal”, e do mesmo modo é induzido à comunicação, ao debate, aos acordos possíveis, em grupos onde a “Identidade” o encante. Se essa Identidade resiste a um limite de riscos, pode até mesmo gerar “Identidades de Projeto” (como teoriza Manuel Castells em 2001) o que significa geração de "Atores Sociais" ( novos agentes políticos) capazes de se responsabilizar por Projetos planetários plausíveis; já temos alguns em andamento!


Alain Tourraine disse um dia que aguardava atores sociais femininos para a deflagração de novas propostas Políticas, Econômicas, Sociais e Culturais.

Se os "Atores sociais femininos de AlainTourraine" forem sujeitos cuja reflexão atinge:

a- As questões de gênero; as questões do leque da afetividade, da sexualidade e das conjugalidades;

b- As questões da ecologia (uma alteridade reflexiva criativamente abstrata, na medida em que pensa até nas outras espécies de vida);

c- As questões da diplomacia como substituto da guerra (outra alteridade reflexiva criativamente abstrata, na medida em que pensa em seus descendentes, inclusive os não sangüíneos, e até (novamente) em outras espécies de vida);...

...estes atores sociais não são “mulheres”!

São, sim, sujeitos autônomos reflexivos e críticos, que – claro - ousam se aventurar no universo reflexivo da intimidade (ou que se aprofunda corajosamente a partir das questões tidas como da própria interioridade; pois – aí sim – a noção de intimidade passa a merecer esse nome).

O preguiçoso “senso comum” é que se acostumou a denominar de “feminino”, “ótica feminina”, etc., muitas coisas que só começarão a se definir de fato (e aí, sim, passarão a merecer algum adjetivo que ainda não temos como saber na verdade qual seria ou será), na medida em que o contingente masculino começar a debater ainda melhor especificamente sobre si mesmo, e emergir como consistente ator social, o que ainda não ocorreu (e ISSO as mulheres e os homossexuais – por exemplo - já começaram a fazer há muito tempo, sem dúvida!).


Fica faltando nas categorias de gênero ESSE importantíssimo coro de atores sociais: os seres nascidos com sexo masculino, para a sua reflexão, INCLUSIVE POLÍTICA (até hoje cristalizada, aliás, como patriarcalista e patrimonialista), ganhar status de integridade.


Hannah Arendt, que não costumava se deter em questões de gênero, fazia questão de assinalar: “...o mundo, inclusive o Político, é constituído de homens e mulheres”...; era a maneira dela de assinalar o quanto isso era importante na hora de compreender e debater a pluralidade humana e seu dueto com a Política.


AINDA: E a AUTORIDADE, como vai?

Pareceria alguma espécie de piada buscar alguma “estatística oficial” para verificarmos quantos Presidentes da República, Primeiros Ministros, Banqueiros, donos de fábricas de armamentos, líderes religiosos, “chefes-de-família” , etc., são homens, quantos são mulheres, e quantos entre eles já “podem”(?!) se assumir como homossexuais?

Ou quantas mulheres, quantos homossexuais, quantos homens-heterossexuais-que-querem-mudar-a-mesmice (eles existem e não são poucos), os cidadãos, já conseguem fugir à pressão de comportamentos patriarcais-patrimonialistas no fluxo de poderes (doméstico, institucional em geral, e profissionalmente político)?


Poderíamos chamar o “resultado vencedor” (óbvia e arcaicamente patriarcal-patriarcalisca!) dessa suposta estatística de FALICIZAÇÃO DE HIERARQUIAS?...


Não esqueçamos que isso estaria LONGE de significar QUALIDADE DE EXERCÍCIO DE PODER!

E olhem que já vivemos tempos e números inimagináveis há vinte anos atrás!...

Mas a cristalização da falicização significaria um “entupimento crônico” nesse fluxo de poder, a dificultar a sadia ALTERNÂNCIA do dito-cujo poder: lesaria a todos.


Se pudermos, teremos uma noção ainda mais clara do quanto é grave (e quanto nos atinge) a questão (não econômica?!) diariamente apontada por inúmeros teóricos e instituições: a crise do patriarcalismo.


Se o “mando e o desmando” mundial, estão nas mãos de uma entidade em crise, à beira da falência, (o Patriarcalismo), urge MESMO que Sujeitos e Atores Sociais reflitam como sobreviver, de preferência com qualidade civilizatória mínima!


Ou alguém ainda precisa de um Godot com um decálogo debaixo do braço, para implantar a Lei, ou o Sentido da Autoridade?...


O Estado (incompetente e burro?), o Mercado (perverso?) e o Falo (falido) do preguiçoso e infantilizado Senso Comum, talvez.

Tantos continuam tentando brincar de “Farão tudo que Seu Mestre mandar”, quando têm a chance de escolher amadurecer, aprendendo o exercício de uma (hipercomplexa?) responsabilidade sobre seu PENSAR – SENTIR – AGIR –RESPONSABILIZAR-SE...


AUTORIDADE – AUTONOMIA – AUTORIA: uma familiaridade de conceitos para não esquecermos de pensar sobre!...


Nas Plenárias do III Colóquio sobre Varões e Masculinidades em Medellín (2008), dois trabalhos (UFF! - também desenvolvidos por mulheres!), chamam a atenção pela identidade das reflexões que provocam diante do nosso específico assunto aqui, e não posso encerrar sem citá-los (o resumo completo de ambos pode ser verificado no site da ONG CLAM; visitem-no):

Enquanto a filósofa Elsa Darlin apresentou a pesquisa “Mitologia da Masculinidade e Pós-Colônia”:

“...para “demostrar cómo la masculinidad/virilidad circula como significante

particularmente productivo del poder”, tornándose “objeto de una recodificación de

la clase dominante blanca en Francia”. La matriz liberal que se instala desde la

creación de los Estados-nación modernos opera un dispositivo en el cual las

masculinidades hegemónicas y alternativas se constituyen mutuamente como

sujeto y abyecto, respectivamente, adquiriendo entidad como realidad y fantasma.

Esta relación compone las líneas de fuerza y tensión de procesos de subjetivación

que naturalizan a la masculinidad blanca. “Si las masculinidades ‘populares’ y/o

‘racializadas’ (encuadradas claramente en la colonización e migración postcolonial

hacia las metrópolis) son objeto de denigración (estigmatizadas como ‘vulgares’,

‘inmaduras’, ‘bárbaras’ y ‘peligrosas’) por parte de clases dominantes cuyo valor es

definido en oposición a ese ‘otro’, podemos considerar que la identidad sexual

participa de un capital semiótico común a ambas masculinidades”.

“De esta manera, los “índices de valores contradictorios” de la masculinidad son claro efecto de un juego de poder. Por este motivo a autora anuncia la caducidad del Hombre universal propuesto por la Declaración de los Derechos del Hombre, enarbolado desde la Revolución Francesa como mito fundante del hombre moderno.”


A socióloga e antropóloga Nacira Guenif Soulimas, em sua proposta “El fin del eclipse francés de la raza y la etnicidad: el caso del joven árabe” acrescentou:

“...los flujos migratorios desde las colonias hacia la metrópolis afectaron de forma

profunda y duradera el paisaje francés en lo que respecta a su definición identitaria,

cultural y nacional. “La línea fronteriza que contenía a los nativos racializados y

sometidos fuera del perímetro de la república blanca, igualitaria y ciudadana, se

desdibuja con el fin del período colonial y la inversión del flujo migratorio de las

colonias hacia la metrópolis, cuando la colonización es repatriada. La salvaguarda

de la masculinidad del Estado-nación francés reposa en el ocultamiento de la

pérdida de poder imperial con acento en una regeneración de “lo europeo”, en

detrimento de “lo africano”.

Es justamente la figura del joven árabe francés la que encarna la

encrucijada cultural de la Francia actual, al encarnar una raza particular: ni negra ni

blanca; “una alteridad racial impuesta pero siempre colocada algo incierto, que le da

cierta apariencia de blancura. Su negritud sería interior, artificialmente contradictoria

con su piel relativamente blanca. El blanqueamiento de los nuevos franceses debe

obedecer a la imagen de un carácter ideal e inaccesible, que permanece en el mito

fundante de Francia como un reservorio de una autenticidad europea autóctona”. A

partir de la inmigración magrebina, esta es reinventada como un anacronismo de lo

‘nativo’ y lo ‘europeo’, que reafirma semánticamente la diferencia...”


Enquanto isso, penso, sinto (muito!) e escrevo.

Não estou “solitária” em minhas reflexões, como se vê acima em todos os fragmentos de textos de tantos autores.

Mas vou ficar MUITO mais feliz (e mais satisfeita politicamente) quando vir os seres nascidos com sexo masculino mais empenhados, entre eles mesmos, em se tornar atores sociais, autores de suas próprias reflexões sobre suas próprias questões, empregando para isso todo o seu SER, e não só o falo; eles ainda são e estão MUITO tímidos nesse processo...

Poderes?

PELO EMPODERAMENTO CRIATIVO (erótico, vivo) PARA TODA A PLURALIDADE HUMANA, SEM PERDER A CAPACITAÇÃO PARA A ALTERNÂNCIA JAMAIS!


Ilustração: ALEXANDER CALDER - LABYRINTH





3 comentários:

Anônimo disse...

Olá, Christina

Estou no final de um trabalho em que quis discutir um pouco sobre identidade.

A identidade que se lapida durante toda a vida, em todas as relações.

O que me levou a estudar o tema - e confesso que fui e ainda estou muito displicente com as pesquisas - é que o olhar do pesquisador, pelo menos na minha área, a geografia, é sobre o macro.

É óbvio que não desprezo este olhar. Porém, penso que a construção do 'mundo' é individual. Uma vida perdida é uma tragédia irremediável, então porque não valorizar esta vida, não é mesmo?

Tudo bem, provavelmente falei bobeirinhas, mas depois da gentil puxada de orelha de seu primeiro post, não poderia deixar de me pronunciar.

Vc foi esperta o/

A propósito, sou amiga da "Diedra" e graças a ela pude encontrar seu blog que me ajudou bastante na construção do meu ainda cambaleante pensamento.

Anônimo disse...

Ésse blog tá cada vez melhor. Ja coloquei nos meus favoritos para ler sempre com calma.
Aquele texto do Qorpo Santo e propósito dos estranhos e loucos, tem tudo a ver. Ainda penso montar um texto dele.
A propósito gostaria muito que visses a minha performance Dizinbolsa - um work in process de Dias Felizes de Beckett. Falo de memória e identidade com a performance das bolsas. Precisamos nos ver e conversar. temos muito o que trocar. Beijos.

Anônimo disse...

não sei o que comentar, sinceramente.

é complexo, profundo e altamente esclarecedor.

enqto seres humanos que somos e enqto amantes... acreditar sempre
!

excelente artigo
!

bj