quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

EM RESPOSTA À REVISTA 'VEJA' DESTA SEMANA: "Que PAI não é MÃE é óbvio; a questão é o QUÊ os homens querem que um PAI seja, que a VIDA seja..."


Caros amigos de ‘VEJA’:

Não fiquei chocada com a matéria sobre paternidade "por ser feminista".

Fugi das 'etiquetas' há muuuuuuitos anos, em busca da singularidade, felizmente.
Fiquei, porque o texto era irresponsável, tendencioso e pobre: a questão das masculinidades é muuuuuuuito mais séria e URGENTE: o sofrimento do universo masculino (estatisticamente!) supera o feminino e o do universo GLBT.

Em especial a relação PAI-HOMEM + FILHO HOMEM tem visivelmente perpetuado um perigoso e pernicioso silêncio.

O fato de não ter nascido com corpo masculino não me afastou do questionamento de meus parceiros-no-mundo, os homens.
Não os considero 'incapazes' nem de se organizarem ao redor de suas próprias questões, nem de criarem novas frentes existenciais para seu particularíssimo perfil..

Uma 'dosagem de testoterona' (?!) que pode ter levado os homens a serem abatidos por índices muuuuuuito mais pesados que os direcionados às mulheres quanto mortes (por violência urbana ou bélica, por diversas doenças, e até pela eventual viuvez), quanto aprisionamentos e internamentos (presídios, hospitais - inclusive psiquiátricos - e similares), quanto lesões graves por acidentes urbanos e bélicos (paraplegias, tetraplegias, mutilações), não me parece exatamente um 'troféu'.

Mas, sem dúvida, não cabe às mulheres interferir no processo decisório deles (homens) sobre que providências tomar; inclusive sobre o que ELES QUEREM que seja a PATERNIDADE.
Para tal, ELES podem (precisam?) se organizar, FALAR, AGIR e SE RESPONSABILIZAR.
.
Até como profissional sempre deixo claro que 'levo perguntas de presente'; as respostas cabem aos principais interessados.

Mas, curiosamente, enquanto a MULHER e o grupo GLBT se tornaram atores socias (se organizaram e se tornaram uma entidade planetária - até no Afeganistão há ONG para isso!), o HOMEM-ATOR-SOCIAL ainda não existe: parece satisfeito com esse letal e doloroso PODER AUTOFÁGICO.

Pois o poder, sim; é indiscutível: o planeta é patriarcalista, patrimonialista, falicista, homofóbico, verticalmente autoritário, bélico e consequentemente filicida (características que infelizmente são compartilhadas por homens E mulheres, NÃO É 'privilégio' do universo masculino).

A 'testoterona ser redimensionada evolutivamente' (para usar a linguagem dos pesquisadores apontados) não significaria 'emasculação', e MUITO MENOS determinante na orientação sexual de homem algum.
Significaria apenas que novos universos existenciais poderiam ser desvendados por homens que valorizassem SUA INTERIORIDADE, que valorizassem sua vida íntima tanto quanto sua vida pública.
A vida pública só tem lucrado com seu inevitável diálogo com as metamorfoses da vida íntima humana.

Está na hora (como alertam outros profissionais brilhantes como Rosiska Darcy e Maria Rita Kehl) de homens e mulheres JUNTOS pontuarem (exigirem?) uma mudança no rumo da relação com suas vidas profissionais, para recuperarem TEMPO de vida: TEMPO de (e para a) INTERIORIDADE; TEMPO para si mesmo, para alquimicamente IR SENDO/MUDANDO/DESCOBRINDO. Desvendando a própria SINGULARIDADE, SINGULARMENTE.
O foco na exterioridade só beneficia um Mercado ávido de escravos e consumidores (sinônimos?).

Pai não é mãe; JAMAIS vi colegas que trabalham com casais que aguardam seus bebês 'exigirem' isso dos pais! E olhem que conheço vários!

Sequer comentaria a colocação no quadro final que avalia isso (até porque não é com isso que trabalho) se - no quadro - estivesse escrito "POSIÇÕES DIVERGENTES".
Como está lá, ("BOBAGENS"), é um insulto, e o pior: um insulto infantilmente mentiroso.
Que grosseria!
HORROR, HORROR...

CHRISTINA MONTENEGRO
http://lattes.cnpq.br/9740919353194479
http://curiosaidentidade.blogspot.com/
http://twitter.com/CHMONTENEGRO



Ilustração: reprodução de um dos cartazes/filipetas de eventos promovidos pelo pediatra Dr.
Marcus Renato de Carvalho

14 comentários:

Giacomelli disse...

Uma tristeza!
Valeu demais a denúncia dessa imprensa burra que teima em se perpetuar no nosso país!

Anônimo disse...

Eu não li o texto da Veja simplesmente porque não leio Veja!!! Mas gostei imensamente do teu texto, tua resposta. Sempre me incomoda demais a visão torpe que muitos tem tanto dos homens quanto das mulheres... Esteriótipos idiotas que são perpetuados como "piadas", que de tanto serem repetidas, passam ao acervo do pensar da sociedade!!!!!

Gostei do teu blog também... :-)
Beijos
Anne

Dona Sra. Urtigão disse...

OLÁ!
Não leio a tal revista há muitos anos. Discordo da linha editorial da Veja. Sempre que "vejo" algo, chego a irritar-me.
Dai limito-me a tentar compreender seu texto a partir de um pressuposto e pelo que sei da sua linha de pensamento.
Acho dificil estabelecer o que deveria ser UMA resposta a uma multiplicidade de problemas, como os que surgem destas relações. Penso que o trabalho sobre si, ja proposto por Socrates,( e estudado por Foucault,) poderia ser essa resposta, independente de casos ou gêneros. Mas a sociedade e seus órgão de (des)informação não tem interesse no desenvolvimento da pessoa, pois é preferível trabalhar e dominar massas.

Laerte disse...

Chris! Não leio mais a Veja, mas sei que ela é lida por muita gente e a sua resposta dá corpo a um debate que poderia ser muito produtivo.
Seria ótimo que a própria revista se abrisse a esse debate.
Coisa meio impossível.
Beijo!

conduarte disse...

Veja? Veja só... mas bom ler o que é ruim, para conseguirmos textos bons quanto o seu...
Agora me diga uma coisa? O que foi aquele recado que deixou pra mim?? Fiquei loira, não entendi nada rsrsrs, bjks, CON

Diego Viana disse...

Não vou nem perguntar qual é o conteúdo do texto da Veja... tem coisas que é melhor não saber. Mas gostaria de contribuir com a história de uma professora da minha universidade, que costumava ser especialista (bom, especialista ainda é) em História da Filosofia, particularmente o período "moderno", séculos XVII-XVIII. Até que ela, nas próprias palavras, "seu deu conta de que era mulher", e uma mulher não poderia fazer história da filosofia porque os conceitos são tão viris (ela evita "masculino" porque acha o termo descritivo demais) que a mulher é obrigada a adaptar (termo dela) seu raciocínio a eles: portando, a história da filosofia que ela fazia era necessariamente manca. Hoje, se dedica a desconstruir a estrutura conceitual da herança filosófica do chamado Ocidente. Uma tarefa hercúlia, certamente, mas bem interessante.

Fran disse...

Querida, muito obrigada pelos parabéns :)
Ah as sagitarianas e os sagitarianos também neh, não somos nada fáceis, mas somos os melhores, os alegres,os festeiros, os aventureiros, os apaixonados e com certeza: os exagerados :)
Parabéns pra você também, porque vi que mudou sua idade no perfil, só não sei o dia exato...

Beeijos!

Unknown disse...

admitir-se diverso e ver na diferença uma soma linda é ser poeta. homem tem mais força fisica e pode falar de flores, q bom.meu pai é assim e nao tem roteiro pronto.

CHRISTINA MONTENEGRO disse...

ALGUMAS RESPOSTAS E COMENTÁRIOS QUE CHEGARAM POR E-MAIL / BILHETES / ETC.

"Booooa resposta pra Veja!
bjs e parabéns!"
MARIA EUGENIA

"Eu adorei , Cristina, um beijo de luz, vou divulgar na lista"
ELIANE POTIGUARA

"Querida Cristina
Não estou conseguindo tempo para abrir o blog do Beto, estou realmente atrasada. O do Ivo sobre literatura nem sei por onde anda, o último mergulho foi a visita de uma amiga escritora no morro onde morou até a adolescência, tinha texto, fotos, mas estou vendo que não dá para acompanhar tudo, é uma loucura. Passei o mouse no seu e, durante quinze minutos a régua mal se moveu para baixo. Desci tudo e fui ao começo, e me dei conta da riqueza dos textos, das citações - isso sem falar na direita muito bem ilustrada com fotos dos seus encontros, de autores e citações ótimas. Embora não seja o tema da identidade que você busca algo que me seja familiar, talvez no lado oposto feminino, mas sem pretensão alguma, mesmo porque não sou profissional na pesquisa do âmago dos seres humanos, percebi pontos interessantes, abordagens singulares e pergunto-lhe, não é e está já com um livro pronto, acabado?
Bjs"
ESTHER LARGMAN

"Olá Cristina!!
Gostaria, se possível, receber a matéria que originou esta sua resposta. Aproveitando, também, para saber da possibilidade e disponibilidade em ministrar uma palestra abordando o assunto "masculinidades" aqui na ******* no próximo ano."
SHIRLEY C.

"Cristina ,vc sempre brilhante, defendendo seu novo homem.Legal, parabens.beijo
ANA CECÍLIA BURLE MARX

Prezada Christina:
Sua resposta à revista Veja está perfeita, não teria nada a acrescentar, a não ser dizer que penso a mesma coisa. Como observação é de se notar que no Brasil muitas pessoas ainda interpretam mal. Este tema eu abordei na minha peça "Participação", que encenei no Espírito Santo no início dos anos 70 (1971/72). Eram quatro estudantes, três mulheres e um homem, que viviam numa pensão vagabunda, cada personagem com um conceito diferente. Uma das personagens, uma mulher mais esclarecida, dizia o que eu queria dizer. Era através dela que eu mandava a minha mensagem. As outras duas meninas tinham posições diferentes. Uma era submissa aos valores existentes e a outra apenas observava e estava ainda em formação de opinião, alternando princípios. O rapaz era inteiramente machista e com valores bélicos. Quando eu chegar te contarei melhor. No interior do Espírito Santo chegamos a ser insultados, porém em Vitória, Vila Velha e Guarapari a peça fez sucesso, aliás, bem maior que esperávamos, quando fomos muito aplaudidos, principalmente na capital. A recompensa é que em Santa Teresa, uma cidade de colonização basicamente italiana, um bancário chamado Jorge, ao encontrar-me em Nova Friburgo, veio à mim e se apresentou para dizer que viu "Participação", mas que na época não gostou, porque não entendeu onde eu queria chegar. Entretanto, alguns anos depois pôde sacar com exatidão o que meu texto queria passar. Estava com a mulher Denise e fez muitos elogios, deixando-me recompensado. Disse que eu era um homem de vanguarda e que na cidade muitos lembravam de mim, principalmente as meninas que viviam oprimidas pelo predomínio patriarcal daquela época. Apesar de ficar achando um exagero seus elogios, fiquei feliz ao ter consciência que ao menos alguma coisa pude influir positivamente. Iréne estava comigo tomando banho numa cachoeira em Muri (localidade pouco antes da cidade de Friburgo) e o Jorge estava acampado com a Denise nas proximidades. Ficamos perplexos quando ele aproximou-se e disse, "você é o Luiz Lages?"! Isto foi em 1986!!! A peça em Santa Teresa em 1971! Ótimo, as coisas muitas vezes ficam e se transformam, evoluindo com o tempo. Dois atores desta peça falaram algo parecido, dizendo para mim, também em meados dos anos 80, que estavam entendendo melhor o que continha no meu texto. Eles que tão bem interpretaram seus respectivos papéis... Assim é a vida..........
Beijos e parabéns pela bela e sensata resposta à revista Veja! Iréne reforça minhas palavras.
Seu amigo,
LUIZ EDUARDO LAGES

CHRISTINA MONTENEGRO disse...

CONTINUAM A CHEGAR RECADINHOS INTERESSANTES:

"Cristina,
Voce pode me enviar o artigo da veja, não consegui ter acesso e estou em Londres nesse momento!!
abraços,"
JORGE LYRA / ONG ‘Papai’

"Parabéns pela carta, ainda que a Veja dificilmente a publicará, acho que você poderia divulga-la bastante - vale a pena"
ROSANE CHONCHOL

conduarte disse...

MInha linda, obrigada pela visita... bom final de semana, bjks, CON

Rafael Castellar das Neves disse...

Olá Cristina!! Muito bem colocado...ainda não vi essa reportagem, mas já estou indo atrás.

Hoje é há um reposicionamento do homem (ser masculino) diante a sociedade - em termos de atitudes, sentimentos e necessidades -, mas que somente é sentido por nós e, como tantas outras coisas, e como você disse, ficam em um segundo plano, oculto pela testosterona. Esse "segundo plano" não é mais quisto por nós, mas exigido por todos. Tem que existir para nos mantermos HOMENS. Acredito, e acreditem, o homem mudou, tem necessidades - não novas, mas que agora podem ser colocadas para fora. Mas a cobrança do inverso é difícil, muito difícil e atrapalha demais a vida.

Há uma frente de filósofos que há alguns anos vêm discutindo esse ponto da posição do homem, como homem, diante da vida.

Um grande abraço,

Rafael

Udi disse...

Chris,
Há muitos anos deixei de ler a Veja e a minha lerdeza não me deixou entender do que se tratava a "baboseira" publicada. Espero que eles tenham publicado a sua carta ou, ao menos, tenham se dignado a uma resposta.
Anyway, estou contigo e não abro!
;)

Unknown disse...

A Veja não dá para levar muito a serio, lamentável...
Adorei teu texto,só hoje consegui deixar meu comentário.
Ainda bem que neste Brasil ainda contamos com intelectuais com clareza de visão como você. Divulgue bem teu blog.
Rosane Chonchol
www.partidodaarte.blogspot.com