terça-feira, 4 de agosto de 2015


CHICO ANYSIO: HOMENS QUE VALEM A PENA:

Já que o Humor é um fenômeno de grande valor reflexivo e dialógico que faço questão de ressaltar, inclusive lembrando constantemente que RIR E PENSAR NÃO SÃO INCOMPATÍVEIS, junto isso à nossa série imaginária sobre HOMENS QUE PENSAM, com o texto de um dos orgulhos brasileiros, Chico Anysio, "Pensamentos sobre a arte de atuar", que encontrei na página de Fabio Porchat :

""Não me considero um Gênio. Genialidade é uma palavra muito usada e, por esta razão, mal usada, nos dias de hoje. Acho que a palavra “gênio” só se aplica a um homem como Sabin, que inventou uma gota que tirou dos pais do mundo inteiro um grande medo, a milagrosa vacina que evita uma doença tristíssima para as crianças. Tudo, então, é conseguido com muito trabalho e, obviamente, muito estudo. Nunca acreditei em inspiração e sempre defendi a transpiração. O meu caso - humorista - é muito especial porque, assim como os poetas, eu não paro de pensar e para tudo que olho, eu olho procurando o que posso tirar de graça daquilo que estou vendo. Tenho idéias que partem que uma frase que escuto, uma pessoa que vejo, uma situação que vivo. Se quiser chamar esta idéia que tenho (porque eu sempre a procuro) de inspiração, que assim seja. O estudo - como as viagens e a vivência - me garante uma cultura geral interessante, que me permite ampliar o meu campo de trabalho. Ele é de importância fundamental
Chaplin dizia: "O humor pode ser tudo, até mesmo engraçado". O dever número um do humor não é tirar um sorriso de alguém, mas alertar a muitos para os erros da vida. Infelizmente eu não tenho poderes para corrigir o que há de errado, mas tenho o dever de denunciar, de enfiar o dedo numa ou noutro ferida, de desmascarar um ou outro patife. É preciso, no entanto, um grande cuidado: não se pode fazer uma piada sobre uma hipótese, mas somente sobre o que é real. Se eu brinco com algo errado mas que é real, ninguém reclama da minha graça e todos ficam sabendo que aquilo existe. Quanto à tristeza de Chaplin, ela fazia parte do todo, porque Chaplin era também um humorista.
Não existe essa de humor antigo e humor novo - ele ou é engraçado ou é sem graça.
Criei centenas de personagens, normalmente os personagens saem de pessoas que conheço. A vida real é a maior inspiração para a criação. Observar as pessoas é uma grande Escola.
As coisas mudam, não é? Muda, muda o tempo, o tamanho do esquete, muda o tipo do esquete, muda o ritmo do esquete e muda o tema do esquete. Você tem que se adaptar ao mundo em que você vive, não é? Eu não tenho o menor prazer em palavrão, em dizer palavrão, eu acho que posso viver a minha vida inteira sem dizer um palavrão, mas no teatro o palavrão é uma arma, uma arma que é necessária quando você quer levantar o público.
Muitos acreditam que o Humor é o melhor instrumento para promover a conscientização política, demolir preconceitos, levar à reflexão de problemas nacionais. Acho que estão certos os que pensam assim. Não temos de resolver nenhum problema, mas temos a obrigação de denunciar o que há de errado.
Muita gente me pergunta se tiro da Angústia pessoal, as minhas fontes para fazer Humor. Não, comigo, da minha própria angústia eu não tiro partido. Eu tiro partido da sua angústia, porque da minha, na minha opinião, não existe, ela está domada, domesticada, está, já é uma coisa, faz parte da minha vida. Então, as demais angústias, sim eu uso, porque uma das armas do humor, das situações que segundo Bernard Shaw são 45, não há mais que 45 situações de humor. Uma delas é a tragédia de ontem. A gente sempre conta rindo o tombo que levou ontem, não é? Mas ontem a gente não riu, a gente ficou vexado e passou situação, ficou desesperado ali. Então, a angústia, esse modo de viver que o humorista tem mais do que os outros, porque o humorista é um observador maior do que os outros... Então, se nós estamos aqui, digamos oito pessoas; se entrar aqui um cabeleireiro, a primeira coisa que ele faz é olhar para o cabelo de cada um, e se entrar um alfaiate ele vai olhar para a roupa de cada um, se entrar um dentista, para os dentes de cada um, mas se entrar um humorista, ele vai olhar para o cabelo, para o terno, para os dentes, para os óculos, para tudo de cada um. Porque o humorista é um observador. Qualquer pessoa que viva de humor, ele tem que olhar tudo na vida, e tudo na vida tem que dar motivo para..., ele procura sempre a graça da coisa. Então mesmo num velório, eu vou a um velório, eu fico olhando o velório com um olho diferente, a não ser que seja velório de parente, não é? Que a pessoa está envolvida, mas um velório aonde você vai para se despedir de um amigo e tal, você vai lá e tal e dá uma olhada, porque velório sempre tem alguma coisa interessante para a gente usar. Quanto mais dramática a situação for, mais engraçada ela ficará..
Nunca quiz mudar de profissão. Pintar sempre foi uma catarse. Os poucos elogios diluíram-se junto com as muitas críticas. Imaginava que a pintura seria um “emprego” para a minha velhice, mas este emprego será o de Ator. Vou morrer representando. Vou morrer no Projac, depois de um diretor dizer: “Corta. Valeu, Chico”. Eu direi: “Que bom que valeu” e morro em seguida. Será bonito." (Chico Anysio; extraído da Entrevista do Roda Viva e Site da Revista de Cultura Agulha).

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